top of page

Por que a madeira é um material especial?

Atualizado: 20 de fev. de 2022

Fico me fazendo essa pergunta.


Acho que são várias as razões, mas talvez nada seja mais importante que a madeira se tratar do corpo em si de um ser vivo, que germinou, cresceu e morreu nos seus próprios termos. Pense se não é incrível: árvores tem pais e mães. Genitores que amadurecem para, na hora certa, unirem suas flores masculinas e femininas. Depois cuidam da sua prole provendo alimento e abrigo, remédio, conhecimento sobre o local onde vivem, fungos e insetos amigos e parasitas. Árvores-criança brotam da terra organicamente, ávidas por sol e água, vão crescendo estação após estação se alimentando do calor do sol para formar seus corpos. Transpiram oxigênio puro e criam a atmosfera que está dentro dos nossos pulmões. Imagine-se por um minuto sem ar. Agradeça a esses seres.


Cada espécie de árvore evoluiu com uma forma de se reproduzir, incluindo estratégias que previnam a auto-polinização para garantir variabilidade genética e maiores chances de adaptação ao meio ambiente em constante fluxo. A vida se impulsiona, sozinha, por viagens polinizadoras que se valem do acaso certeiro do vento, ou das abelhas, vespas, morcegos, borboletas, pássaros e besouros. Polinizadas, sementes se formam e viajam em frutos, castanhas, na água ou novamente ao vento, até que encontram, com sorte, uma morada. Como não se maravilhar, nessa hora, de ver como as sementes sabem que fazer. O tempo de aguardar em dormência, o momento de abrir sua casca, para onde lançar o primeiro feixe de raiz, por onde arquitetar seus ramos. Sementes tem uma cartilha precisa. Seguem à risca instruções guardadas nas suas moléculas de DNA, maravilhosamente similares às nossas próprias. Pense que toda a vida conhecida é codificada no mesmo idioma. A variedade e complexidade inimagináveis descritas com as mesmas poucas palavras-gene. Quem precisa de fantasia quando se depara com a vida?


E crescem essas árvores, formando seu corpo lenhoso com longas e complexas cadeias de carbono, o seus tijolos-celulose e o seu cimento-lignina. Troncos e galhos de células alongadas, em forma de vasos que se conectam e entrelaçam, condutores de seiva bruta e seiva açucarada. Desenvolvem medula, xilema, alburno, tecido complexo, poroso e imensamente resistente porque aprendeu com o tempo a se curvar quando preciso. E a seguir quando possível, presente, metade na terra e metade no ar. Enquanto crescem nos seus anéis, inspiram o CO2 que despejamos no ar, esquentando nossas tardes, e o reconfiguram em forma sólida, podendo permanecer assim fixado por milênios. Sorte a nossa. Incríveis máquinas captadoras de CO2, auto-programadas e auto-constituídas, seres alimentados pelo sol, formadores de atmosfera e de solos, provedores de alimento e habitat para humanos e mais-que-humanos, geradores de rios flutuantes, reguladores do clima, anciãos milenares, pais incansáveis, mães generosas. Eu só respiro porque ela, antes de mim, transpira.


A madeira é inigualável porque pertence à vida. Acredito que quem se aproxima dela entende isso de alguma forma. Eu sigo tentando me aproximar para entender, e me alegro de ser um trabalhador da madeira. Gosto de pensar que sigo um ofício simples e honesto, de conformar um material único, que me ajuda a entender meu lugar entre os que vivem.


14 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page